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Alberto Carlos Almeida

Cientista político, sociólogo e pesquisador

Alberto Carlos Almeida

Cientista político, sociólogo e pesquisador

Beto Barata/PR - 2.fev.2017

Doença, morte, velório e Política

por | fev 11, 2020 | Política | 0 Comentários

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Visitas a Lula na agonia de Marisa Letícia indicam possibilidade de diálogo

A morte de figuras públicas, assim como trágicos acidentes de avião, revelam o que ninguém gosta de ver por muito tempo: a nossa finitude, ao menos neste mundo. La Rochefoucauld, um famoso moralista francês do século de XVII, afirmara que “não podemos olhar fixamente por muito tempo nem o sol, nem a morte”. Olhar de vez em quando, tudo bem. Olhar demais, nem pensar. É com este pano de fundo que devemos encarar todos os acontecimentos em torno do falecimento de Dona Marisa.

Na política, assim como na vida, os símbolos importam, e muito. A nossa finitude motivou Lula a visitar e abraçar Fernando Henrique quando Dona Ruth partiu. A reciprocidade veio agora, quando Fernando Henrique visitou Lula e o abraçou afetuosamente. Símbolo maior não há: 2 ex-presidentes, que governaram o Brasil por 8 anos consecutivos, e implementaram agendas próprias, se encontram em raros momentos, sendo um deles aquele momento crucial no qual damos uma olhadinha para o sol. Vale lembrar que os 2 viajaram juntos, já como ex-presidentes, no avião presidencial que os levou para o enterro de Nelson Mandela. Não foi coincidência, mais um raro momento, motivado pela morte, em que se encontraram.

Episódio repleto de simbolismo foi a visita do Presidente Michel Temer a Lula, também no hospital. O mandatário máximo da nação estava acompanhado de seu Ministro Fazenda, Henrique Meirelles, de vários senadores importantes e de José Serra, candidato a presidente derrotado por Lula em 2002. Ambos conversaram sobre política, quando Lula se colocou disponível a ser recebido pelo Presidente, e ele, por sua vez, manifestou simpatia pela oferta de Lula. Não será surpreendente, portanto, se o Presidente Temer receber Lula no Palácio do Planalto ou no Alvorada.

O simbolismo também existe nas visitas não ocorridas: as de Aécio e Alckmin, ambos com ambições presidenciais em uma corrida a ser realizada em menos de 2 anos. Os tucanos demarcaram claramente que Lula está de um lado e eles de outro. Trata-se de algo aplaudido por seus respectivos eleitorados, mesmo na morte. Muitos acharão que isto revela o elevado grau de radicalismo de nossa atual disputa política, pode ser. Afinal, é possível separar o que nos divide do que nos coloca no mesmo barco. Ideias, ideologia e o apoio a diferentes políticas públicas, em geral, nos divide. Mas enfrentar a nossa finitude tende a nos unir.

A visita de Temer a Lula, assim como o diálogo que travaram, indica a natureza conciliatória de ambos. A morte física, este inimigo comum invencível, serve de motivador para que seja contornada ou evitada a morte política, este inimigo apenas dos políticos, celebrizado na comparação que Churchill fizera ao dizer que a diferença da morte política para a morte física é que a primeira pode ocorrer várias vezes. A causa mortis política, para muitos, pode ser a Lava Jato. Cumpre, portanto, quebrar o gelo, abrir linhas de comunicação, dialogar para, quem sabe, mais adiante, enfrentar juntos a ameaça representada pela apuração do maior escândalo de corrupção do Brasil.

Lula sabe que precisa de ter um bom diálogo aberto com o governo. Ele pertence à elite política, está longe de ser um daqueles militantes que hostilizou Temer e sua comitiva na chegada ao hospital. Por outro lado, o Presidente Temer sabe que uma eventual ajuda do PT na Câmara e no Senado pode ser importante para que as reformas liberalizantes sejam aprovadas da melhor maneira possível.

Os simbolismos que marcaram o súbito adoecimento de Dona Marisa, seu falecimento e funeral não param por aqui. Ela foi velada no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC em São Bernardo, berço político de Lula e do PT. Além disso, Lula discursou afirmando que Marisa morreu triste. Em um velório de uma ex-primeira dama, cujo viúvo almeja escapar da morte política, o discurso é algo tão esperado quanto a bandeira de um clube sobre o caixão de um ex-jogador de futebol, ou o canto de um samba no enterro de uma esposa de sambista. A grande diferença é que a política, ao contrário do entretenimento, é uma atividade pública, levada a cabo por adversários e que mexe com a vida das pessoas. Daí a controvérsia acerca do discurso. Vale lembrar, todavia, algo inevitável: o funeral de uma ex-primeira dama é sempre um ato político, com ou sem discursos.

Para nós, que diferentemente de Dona Marisa continuamos neste mundo, resta-nos confiar no sistema político brasileiro. Que ele seja capaz de nos fazer sair da crise, oferecendo aos políticos a estrutura de incentivos que os levará a tomar as decisões mais acertadas. É este sistema que puniu Dilma, ao exagerar no conflito, e vem premiando o Governo Temer, ao buscar, nas palavras do próprio Presidente, a pacificação política do país. A morte de Dona Mariza deu a Presidente a chance de mostrar que a busca desta pacificação inclui Lula e o PT.


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