Bolsonaro em 2018 e Trump em 2016 foram menosprezados pela maioria das pessoas que têm valores universais e que compartilham os ideias de justiça e cidadania. Ambos chegaram à presidência falando barbaridades: frases racistas, machistas e homofóbicas, além de defenderem tratar de forma agressiva seus opositores. A simbologia que gravitava em torno dos dois levou a grande maioria dos analistas, justamente por terem valores muito diferentes, a considerar que não venceriam. O preconceito em relação a Bolsonaro e Trump, ao que eles representavam, contaminou a análise acerca de suas chances de vitória. Algo semelhante também aconteceu no plebiscito do Brexit.
Hoje, no Brasil, o menosprezo à capacidade de Bolsonaro representar a maioria dos brasileiros continua. Muitos afirmam que ele venceu por causa do antipetismo. Quem faz isso desconsidera os méritos de Bolsonaro e prevê que, no caso de um segundo turno em 2022 com um candidato do PT, ele será reeleito. Se apenas o antipetismo tivesse o condão de eleger Bolsonaro as coisas estariam resolvidas. Bastaria que um opositor não petista do Presidente passasse a atuar desde já atacando sem cessar o PT que ele começaria a retirar votos que hoje são de Bolsonaro. Todos sabem que muitos já tentaram este caminho sem sucesso.
É esse menosprezo que faz com que as pessoas não entendam porque na recente pesquisa do Datafolha apenas 8% dos brasileiros consideram Bolsonaro o principal culpado pelas mortes por Covid. Ele sabe representar a mentalidade fatalista do brasileiro. A grande maioria de nossa população acha que Deus controla parte do futuro, por outro lado, é pequena a proporção de quem acha que não há destino algum nas mãos de Deus. Vemos a predominância desta mentalidade toda vez que alguém comenta a morte de um amigo ou conhecido que já havia escapado de uma situação perigosa: “morreu porque tinha chegado a hora dele”.
Quando o Presidente afirmou que todos iriam morrer mesmo, ele nada mais fez do que representar a mentalidade fatalista do Brasil, ele representou o povo. Nós, pessoas com superior completo e razoavelmente céticas quanto ao destino nas mãos de Deus, achamos que a ação individual humana pode deter a escalada de mortes causadas por um vírus. Porém, vale registar o raciocínio de alguém que tem a visão oposta à nossa, ela pensa mais ou menos assim: “doenças e vírus irão surgir de tempos em tempos, e muitas pessoas acabam morrendo por causa disso. Se elas morrem, é porque chegou a hora ou porque não se cuidaram, ou simplesmente deram azar”. Ainda poderia ser adicionado nesta forma de pensar o vírus como punição divina pelo desregramento social.
Bolsonaro empolgou e foi eleito em 2018 não apenas por causa de um fator negativo, o antipetismo, mas certamente por conta de elementos positivos que o tornam próximo do povo. Bolsonaro conhece intuitivamente o seu país, e o representa – ao menos uma fatia considerável dele – quando age e fala da maneira que já conhecemos. Tudo isso continua nos escandalizando, porém, seria adequado que não mais alimentasse nosso menosprezo em relação a sua força eleitoral. Foi porque deixou de menosprezar Trump que o Partido Democrata o derrotou em 2020.
Análise muito precisa. Porém, precisamos de luz no fim do túnel. Não podemos estancar nesse encontro do político com o fatalismo tão grande no Brasil. Acredito que as forças de esquerda e as forças progressistas não sabem como fazer o esclarecimento crescer entre os eleitores.
“Nós, pessoas com superior completo…”
Boa noite, Alberto Carlos.
Não vi os resultados do Datafolha por estrato social, mas as pessoas com superior completo apoiam Bolsonaro. Provavelmente. O que explica esse paradoxo?
Esse trecho me levou à seguinte reflexão:
Desconsidere “Esse trecho…”
Boa noite, Adolfo Silva Rego.
Suspeito que o Carlos Alberto Almeida tenha utilizado a conjunção “e” como aditiva, ou seja, no sentido de “não só…, como também…”.
Assim, ele teria imposto para a sequência do raciocínio as duas condições necessárias: “ensino superior” e “razoavelmente céticas quanto ao destino nas mãos de Deus”. Destaque para o “razoavelmente” relativo ao “céticas” (= laicas). Se cumprir um dos requisitos (como ter ensino superior), mas não cumprir o outro (laicidade), não pode ser entendido, classificado, categorizado dentro do conceito “Nós”.
Portanto, não há paradoxo algum.
Concordo com Maria Mancha
” Acredito que as forças de esquerda e as forças progressistas não sabem como fazer o esclarecimento crescer entre os eleitores.”
Exatamente isso.
#Fora Bolsonaro