De tanto Bolsonaro e seus seguidores defenderem a intervenção militar, já temos hoje no Brasil uma pequena mostra de como ficaria o país se de fato algo assim ocorresse. Há um ministério totalmente tomado por militares. Estou falando do ministério da Saúde.
Só para recapitular, havia um ministro médico e político, Luiz Henrique Mandetta, que estava se saindo bem. Dizem que foi justamente por isso que Bolsonaro encrencou com ele até que pedisse demissão. O Presidente então convidou outro médico, Nelson Teich, mas antes que assumisse nomeou um general para o cargo de secretário-executivo, o segundo em importância na hierarquia. Em questão de poucos dias mais oito ou dez militares foram nomeados. Quando Teich assumiu já havia intervenção militar. Resultado, ele pediu demissão em menos de um mês, pois viu que o terreno estava ocupado por gente desqualificada.
O general ministro interino produziu um documento com regras sugeridas para uso da cloroquina no tratamento do Covid-19. Apenas “sugeridas”, porque o tal documento não tem a assinatura dos técnicos responsáveis por ele. É um documento para satisfazer a vontade de Bolsonaro. Depois da saída de Nelson Teich o numero de militares em cargos importantes na Saúde já passou de vinte. Vários médicos e outros técnicos da área pediram demissão ou foram defenestrados. Sejamos claros: já temos um ministério sob intervenção militar. Só precisamos observar para ver como isso está funcionando.
Chegamos a mais de 34 mil mortos pelo Covid-19 e estamos na casa de 1.500 mortos por dia. Todos os especialistas afirmam que a taxa de transmissão da doença é de mais de 1,4 por infectado, a maior do mundo. As previsões são sombrias: podemos atingir 100 mil, talvez 120 mil óbitos. O que declaram sobre isso as duas dezenas de militares que ocupam o ministério mais importante para qualquer país em uma pandemia? NADA! Eles aboliram as entrevistas diárias que eram realizadas para informar sobre a evolução do combate à pandemia. Eles sequer conseguem contabilizar o número de mortos. O ministro interino não abre a boca para dar qualquer notícia para a sociedade.
A especialidade do general ministro é a logística: serve para organizar a fila de milhares de sepultamentos ou para agilizar a distribuição de cloroquina. Talvez ele consiga áreas para a instalação de novos cemitérios. O que precisamos mesmo é de um ministro da Saúde. Precisamos de um ministério com médicos, biólogos, matemáticos e gente com competência para enxergar todo o quadro da nossa saúde a fim de propor alternativas e estabelecer políticas em conjunto com estados e municípios. Esse batalhão militar que invadiu o ministério não está servindo para nada disso.
A intervenção militar no ministério da Saúde é um completo desastre. O Brasil tem o SUS, um sistema com enorme capacidade de atendimento à população. Militares não o conhecem porque têm hospitais e médicos próprios. O papel do ministério da Saúde é o de ajudar, financiar e coordenar os esforços contra a crise, é o de estabelecer políticas depois de ouvir as partes envolvidas. Não pode jamais ser um ministério da boquinha, só para abrigar amigos e correligionários do Presidente da República. Já há mais de 3000 militares em postos de confiança dentro do governo. Ou seja, essa intervenção não é só na Saúde.
Sejamos realistas, a intervenção não deu certo. Bolsonaro tem que devolver a Saúde a técnicos e especialistas em elaborar e tocar políticas da área. Não é possível continuar a brincar com a vida dos brasileiros. Ainda dá tempo de salvar milhares de pessoas. Acabem com essa intervenção!
Projeto genocida de um autoritário, que busca ser totalitário, em curso.
Tragédia anunciada. A pandemia só potencializou ainda mais o problema.
Já tivemos a experiência de 21 anos de ditadura militar, que pegou um país em crescimento econômico e devolveu com uma coisa chamada estagflação, ou seja, sem crescimento e com inflação subindo sempre. Como dizem, cada um no seu quadrado. E o quadrado dos militares não é a governança. Eles entendem de outra coisa, que não sei bem o que é!